domingo, 21 de junho de 2009

Um dia de sorte

A tarde da última quinta-feira, 18 de junho de 2009, não rendeu muito no trabalho. Depois de agendar online minha entrevista na embaixada americana em Atenas para o dia 7 julho, iniciei o procedimento de clicar compulsivamente no botão "Atualizar". O motivo, conseguir uma data mais cedo para poder comprar o quanto antes a passagem que já aumentara de preço à média de 10 euros por dia nos últimos 3 dias. Por volta das 16h00 o sistema foi atualizado e consegui remarcar para o dia seguinte.

Sem muito planejamento fui para o centro comprar a passagem de barco e arrumar minhas coisas para mais uma viagem de bate-e-volta para Atenas. Como da outra vez, fui sozinho e ocupei 50% do espaço da minha mochila com meu equipamento individual de escalada (daisy chain, sapatilha, capacete, cadeirinha, mosquetões e freio). Nem tive tempo de tentar pedir para alguém algum contato de escalador de Atenas, mesmo porque seria infrutífero.

Cheguei cedo em Atenas e apesar do agendamento fui o primeiro a ser atendido. Em cerca de uma hora meu visto foi aprovado. Fui para o centro passar numa livraria e me atualizar sobre o que havia de novo na literatura grega contemporânea e depois passei no DOATAP, um órgão grego para validação de diplomas (meus diplomas precisam ser reconhecidos para eu cursar o doutorado).

Às 11h00, mais tarde do que esperava, lá estava eu em Filopapou, o setor de escalada que fica próximo ao Acrópole e que visitei na outra oportunidade. Dei uma passada rápida por todo o setor para ver se tinha alguém por ali. Não tinha ninguém. O setor azul já estava tomado pelo sol, e apesar da sombra de árvores e arbustos na base, prossegui para o setor vermelho que ainda estava sombreado. Fiquei me exercitando na base das vias e acompanhando o sol que se aproximava rapidamente. O setor vermelho é o mais interessante dos três que formam Filopapou. A pedra parece uma cachoeira de calcáreo que congelou. É muito lisa ainda mais com o pó fino do chão que tomou conta da sola da sapatilha. Há poucas agarras para mão, mas bastante apoio para os pés, ainda que lisos. As agarras para mão são muitas vezes verticais, em sulcos formados pelo calcáreo que "escorreu" como estalactites (ou estalagmites) que foram coladas umas sobre as outras na pedra. Além das fotos registrei num vídeo tedioso a brincadeira, que pode ser visto mais abaixo.

Quando o sol chegou fugi dele indo para um bloco de boulder entre o setor verde e o vermelho. Um árvore se encarregava de fazer sombra. O bloco tem uma dezena de problemas quase todos bem negativos de VIsup a VIIc. Resolvi tentar o Η (letra grega Íta e não o nosso agá), o mais fácil de todos. Fiz três tentativas e quase tive sucesso na última delas. Parei para preservar os braços desabituados a este tipo de escalada. As duas primeiras tentativas e parte da terceira também ficaram registradas no vídeo que pode ser visto abaixo.

Na sequência fui para uma parte do setor verde onde há alguns probleminhas fáceis e ali parei para descansar um pouco antes de continuar. Já estava há uma hora no setor e parecia que seria mais um dia sozinho em Atenas. Do nada surgiu um cara, com cara de estrangeiro com um livrinho laranja na mão (o guia de escalada de Atenas).

Era o Dave, um Canadense de Toronto, de 38 anos, bombeiro, que estava em Atenas esperando a namorada para irem escalar em Kalymnos por duas semanas. A namorada dele mora a uma hora de Squamish, um setor violento de escalada no leste no Canadá. Ele disse que o grau dele é por volta do 6a francês (e pareceu ser isso mesmo) e que escala mais tradicional do que esportiva. Já esteve em diversos lugares dos EUA para escalar, por tudo na Espanha e também em Arenales e no Frei na Argentina, este último o preferido dele. Papo vai papo vem, perguntei se ele tinha corda, e ele disse que sim, mas que estava no hotel. Fizemos um dois probleminhas por ali e ele, ficamos entediados e ele perguntou sobre o resto do setor. Descrevi rapidamente o que tinha visto e sugeri tentarmos algumas coisas. No final das contas ele perguntou se não era melhor ir buscar a corda e respondi imediamente que sim.

Levou uma hora sob sol escaldante e no metro para irmos e voltarmos. Aproveitei para me reabastecer de água e comprar algumas frutas. Não sei exatamente que horas começamos a escalar, mas ficamos até as 17h00 e não ficamos incomodados com o sol.

Começamos pelo setor azul e guiamos as vias 10 (V), 11 (V) e 13 (Vsup/VI). Depois o Dave ainda guiou a via 9 (VI). Fui de top rope até a metade, mas não aguentava mais. Ele ainda guiou mais uma vez para tentar encadenar e paramos por aí. Ele estava com uma corda dupla bem puída e com ela escalamos. O calor, apesar de não nos incomodar, nos desgastou rapidamente e nem conseguimos escalar no setor vermelho que tem a rocha mais peculiar. Um cheiro de cocô aquecido pelo sol pairava no ar e estava começando a ficar perto do insuportável também. Não conseguimos achar a fonte e sugeri que poderia estar numa caverninha para baixo do setor (apesar de não pegar sol ali). Um fato inusitado foi, depois de já termos escalado duas vias cada um, um cara aleijado sair de dentro da caverna com a maior naturalidade.

Encerramos a escalada tomando um suco (eu) e um chopp (ele) num barzinho perto da Acrópole. E ele que pagou, hehe.

Como a bateria da máquina acabou tenho poucas fotos. Só tiramos uma foto com a máquina do Dave que publicarei oportunamente se ele me enviar. Apesar da falha com a máquina, foi um dia de sorte!

Link para o álbum desta publicação: Um dia de sorte

Vídeo do setor vermelho e do boulder (5,5 minutos):

Um comentário:

  1. Legal essa formação, parece um monte de "pinças". Sorte de achar o gringo mesmo. Essa do mendigo foi massa, ele tava estudando vocês na surdina
    Eduardo

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